sábado, junho 28, 2014

Conto: Pênalti













Pênalti*

Quando Maria chegou, o bar estava cheio, todas as mesas ocupadas. Excitadas, as pessoas falavam alto, gritavam pedindo chope. Os garçons, suados, entre as mesas, misturavam-se ao bando que buscava uma cadeira extra. Cumprimentou o dono:
- "Seu Antônio, arranja uma cadeira para mim?" Ele virou-se e trouxe um banquinho de trás do balcão.
Ela sentou num canto de onde via a TV de longe. Não fazia questão de acompanhar o jogo, "ficar só em dia de jogo é duro", pensava. Os patrões viajaram, nem ver a TV da sala poderia, não saberia ligar.
O jogo começou, fez-se silêncio,  cortado por gritos de torcida. Lá fora, a rua deserta. A vida havia parado, só o jogo importava, menos para ela, que gostava do calor, do cheiro de gente, fazia tempo não sentia ninguém por perto.
1x1 e veio o intervalo. As pessoas em direção ao banheiro esbarravam nela. Um homem tropeçou no seu pé, abriu um sorriso e disse:
- "E ai? Torcendo muito?"
Ela sorriu, tímida, ele a olhou de alto a baixo, desnudando-a. Sentiu que corou.
Ele ficou por ali ao sair do banheiro.
Devia vir da praia, tinha a pele curtida, pernas num short curto.
Quando o jogo recomeçou, ele encostado no balcão, muito perto, a olhava insistentemente. Ela já não via mais nada, apenas o homem se chegando. Ele sentou ao seu lado, encostava a coxa na perna dela. Ela levantou-se, pensou na sua magreza, no corpo que ninguém vê, pediu mais chope no balcão, voltou a sentar, encolhida no banco.
O homem não tirava os olhos dela, já não via o jogo.
Num certo momento todos gritaram:
- "Pênalti, é pênalti!", o homem a puxou para o banheiro, ela não resistiu, sentiu o cheiro ocre, enquanto ele a levantava, empurrava contra a parede. Fechou sua boca num beijo que lhe tirou o fôlego, enquanto levantava sua saia e arrancava com violência a calcinha.
Ela esqueceu o cheiro. Gozou gemendo num grito abafado pelo beijo do desconhecido. Era dia de jogo do Brasil.

*Este conto está no livro "A cabeça do futebol".

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